DUNGA: "NOSSA LÍNGUA É OS PÉS"!!!
A pedidos de Murilo:
Terminada a partida do Brasil contra a Noruega [Brasil 1x2 Noruega em 23/06/98], começaram as inevitáveis conversas sobre os motivos do fracasso brasileiro. Jogadores e comissão técnica resolveram fazer uma reunião para que todos pudessem pôr tudo em pratos limpos, lavar a roupa suja.
Depois da reunião, o capitão Dunga concedeu entrevista. Começou dizendo: "Não adianta ficar falando. Nosso negócio é jogar". E acrescentou: "Nossa língua é os pés". Como meu negócio não é jogar — é discutir casos de língua —, vamos analisar o que disse Dunga — sobretudo a concordância do verbo ser.
Lembro-me de uma propaganda de uma fábrica de peças para automóveis que dizia: "No meio da chuva, o coração do seu carro são as palhetas e limpadores...". Se você parar na palavra "carro" e pedir a alguém que complete a frase com uma forma qualquer do presente do indicativo do verbo ser, certamente a resposta será "é": "No meio da chuva, o coração do seu carro é..."
Essa concordância seria correta se o que viesse depois também estivesse no singular. "O coração do seu carro é o motor", por exemplo. As gramáticas dizem que, quando o verbo ser une nome de coisa no singular (coração) e nome de coisa no plural (palhetas e limpadores), prevalece o plural, independentemente da ordem. "A cama são umas palhas", escreveu Camilo Castelo Branco.
Na propaganda, o plural está em palhetas e limpadores. Mas — convenhamos — essa concordância e a de Camilo causam desconforto, justamente porque o que se espera é a concordância com o que veio antes (coração e cama). Pode-se concluir, então, que Dunga errou. Deveria ter dito "Nossa língua são os pés". Mas uma vasculhada em boas gramáticas nos põe em alerta.
Apesar de recomendarem o plural, vários autores dizem que, em casos semelhantes, não faltam exemplos em que o verbo ser aparece no singular. Muitos escritores não optam pelo plural, quando querem enfatizar o que é expresso pelo singular. Isso daria crédito à concordância de Dunga.
E é aí que a roda pega. Se Dunga queria dizer que o negócio de boleiro são (ou "é"?) os pés, era mais do que necessário enfatizá-los. Ao conjugar o verbo no singular, Dunga — ato falho? — mostrou que não acredita muito nos pés da moçada escalada por Zagallo.
Por todos os motivos — e para a felicidade geral da nação —, corrijamos a concordância do capitão: "Nossa língua é os pés".
Terminada a partida do Brasil contra a Noruega [Brasil 1x2 Noruega em 23/06/98], começaram as inevitáveis conversas sobre os motivos do fracasso brasileiro. Jogadores e comissão técnica resolveram fazer uma reunião para que todos pudessem pôr tudo em pratos limpos, lavar a roupa suja.
Depois da reunião, o capitão Dunga concedeu entrevista. Começou dizendo: "Não adianta ficar falando. Nosso negócio é jogar". E acrescentou: "Nossa língua é os pés". Como meu negócio não é jogar — é discutir casos de língua —, vamos analisar o que disse Dunga — sobretudo a concordância do verbo ser.
Lembro-me de uma propaganda de uma fábrica de peças para automóveis que dizia: "No meio da chuva, o coração do seu carro são as palhetas e limpadores...". Se você parar na palavra "carro" e pedir a alguém que complete a frase com uma forma qualquer do presente do indicativo do verbo ser, certamente a resposta será "é": "No meio da chuva, o coração do seu carro é..."
Essa concordância seria correta se o que viesse depois também estivesse no singular. "O coração do seu carro é o motor", por exemplo. As gramáticas dizem que, quando o verbo ser une nome de coisa no singular (coração) e nome de coisa no plural (palhetas e limpadores), prevalece o plural, independentemente da ordem. "A cama são umas palhas", escreveu Camilo Castelo Branco.
Na propaganda, o plural está em palhetas e limpadores. Mas — convenhamos — essa concordância e a de Camilo causam desconforto, justamente porque o que se espera é a concordância com o que veio antes (coração e cama). Pode-se concluir, então, que Dunga errou. Deveria ter dito "Nossa língua são os pés". Mas uma vasculhada em boas gramáticas nos põe em alerta.
Apesar de recomendarem o plural, vários autores dizem que, em casos semelhantes, não faltam exemplos em que o verbo ser aparece no singular. Muitos escritores não optam pelo plural, quando querem enfatizar o que é expresso pelo singular. Isso daria crédito à concordância de Dunga.
E é aí que a roda pega. Se Dunga queria dizer que o negócio de boleiro são (ou "é"?) os pés, era mais do que necessário enfatizá-los. Ao conjugar o verbo no singular, Dunga — ato falho? — mostrou que não acredita muito nos pés da moçada escalada por Zagallo.
Por todos os motivos — e para a felicidade geral da nação —, corrijamos a concordância do capitão: "Nossa língua é os pés".
É isso.
Professor Pasquale Cipro Neto, Texto publicado em 02/07/98
Facebook, Professor Pasquale
Professor Pasquale Cipro Neto, Texto publicado em 02/07/98
Facebook, Professor Pasquale
0 comentários:
Postar um comentário